A panela assombra muito mais do que a bengala

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Por José Horácio Halfeld Rezende Ribeiro

A Câmara dos Deputados aprovou em segunda votação a Proposta de Emenda à Constituição nº 457-C, de 2005, numa noite repleta de simbologia.

Há muito tramitava a Proposta de Emenda à Constituição, ao lado de inúmeras outras propostas, cada qual com uma solução. A grande questão que se põe é exatamente: o que se pretende solucionar?

O atual frenesi legislativo apresentado pelo Congresso Nacional tem sido acusado de casuísmo, o que é deveras duvidoso de se sustentar a partir da premissa de que a função do Poder Legislativo é a produção das normas por políticos eleitos pelo povo.

Reclamar da produção das normas, ou do seu conteúdo, somente escancara um problema maior decorrente da crise de legitimidade dos eleitos manifestada pela sociedade.

E na mesma noite, pouco antes do caloroso debate entre os parlamentares para a aprovação da denominada “PEC da Longevidade” ou “PEC da Bengala”, voltava à cena a panela, como instrumento de protesto contra a corrupção, exatamente no horário do programa eleitoral gratuito na televisão.

O ingrediente político é inerente ao exercício de todas as funções do Estado, sendo certo que ninguém deve ficar agastado com os encaminhamentos legitimamente promovidos pelos Poderes constituídos.

Ledo engano daqueles que avaliam como uma derrota do governo a aprovação da PEC da Bengala, pois a presidente da República não está, nem nunca esteve, preocupada com a bengala. A preocupação é com a panela.

O que dizer da inexplicável demora na escolha do novo ministro do Supremo Tribunal Federal, que revela um ataque frontal à tripartição dos Poderes, independentes e harmônicos entre si, decorrente de uma omissão reiterada do Poder Executivo?

A dúvida demonstrada pela presidente da República também coloca a sociedade em dúvida se esta prerrogativa de escolha estabelecida pela Constituição Federal atende ao anseio e à necessidade de um Poder Judiciário independente e eficiente. Basta imaginar, se dependesse do presidente do Supremo Tribunal Federal a indicação do ministro da Fazenda, se seria razoável aguardar mais de oito meses para tal providência?

Agora cabe ao Poder Legislativo avançar, pois o texto aprovado estabelece em seu Artigo 40, parágrafo 1º, inciso II, que a aposentadoria acontece “compulsoriamente, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição, aos 70 (setenta) anos de idade, ou aos 75 (setenta e cinco) anos de idade, na forma de lei complementar”; e no artigos 99: “Até que entre em vigor a lei complementar de que trata o inciso II do § 1º do art. 40 da Constituição Federal, os Ministros do Supremo Tribunal Federal, dos Tribunais Superiores e do Tribunal de Contas da União aposentar-se-ão, compulsoriamente, aos 75 (setenta e cinco) anos de idade, nas condições do art. 52 da Constituição Federal”.

Logo, aplica-se de imediato a ampliação do prazo da aposentadoria compulsória para 75 anos aos ministros do Supremo Tribunal Federal, dos tribunais superiores e do Tribunal de Contas da União.

E os demais servidores? A eles está destinada a edição de uma lei complementar.

caput e o parágrafo 1º do artigo 40 da Constituição Federal, não modificados pela PEC aprovada, preconizam:

“Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.

§ 1º Os servidores abrangidos pelo regime de previdência de que trata este artigo serão aposentados, calculados os seus proventos a partir dos valores fixados na forma dos §§ 3º e 17: (…) ”

Portanto, poderá haver a ampliação do prazo da aposentadoria compulsória para 75 anos para todo o funcionalismo público, se for aprovada a lei complementar.

Segundo é anunciado, essa ampliação verdadeiramente causaria um impacto na previdência e nos gastos públicos, o que representa a preocupação substancial com a redução das despesas, não somente na sua quantidade, mas na correta aplicação dos recursos, especialmente com a publicação da Lei de sugestivo número 13.115, do último dia 22 de abril, que aumenta a verba destinadas aos partidos políticos de R$ 289,5 milhões para R$ 867,5 milhões. E mais, a inacreditável redução do orçamento da educação sob o slogan da “Pátria Educadora”.

A panela assombra muito mais do que a bengala. É mais barulhenta e não serve de apoio, sendo capaz de produzir um cozido para saciar a verdadeira fome que assola o país.

José Horácio Halfeld Rezende Ribeiro é presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo – Iasp.

Fonte: ConJur