A Justiça e a corrupção

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Ao estabelecer as metas de produtividade para 2014, os presidentes dos tribunais brasileiros se comprometeram, entre outros objetivos, a julgar todos os processos de improbidade administrativa e todas as ações penais relacionadas a crimes contra a administração pública – inclusive corrupção – distribuídos até dezembro de 2012. Na época, segundo as estatísticas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 20,8 mil processos de improbidade e 88,8 mil ações envolvendo crimes contra a administração pública aguardavam julgamento.

Ao consolidar o balanço das atividades desses tribunais no ano passado, o Departamento de Gestão Estratégica do CNJ constatou que apenas 55,42% da meta foi atingida. A maior carga de trabalho ficou com os Tribunais de Justiça, que julgaram 50,4% de seu estoque de ações. Dos 53,9 mil processos julgados, 39,7 mil eram relacionados a práticas que lesam o patrimônio público. O melhor desempenho foi dos Tribunais de Justiça do Acre e do Amapá. Como são Estados pequenos e pouco populosos, as duas Cortes têm um volume reduzido de processos em tramitação e a maioria das ações trata de questões corriqueiras e relativamente simples.

Já os Tribunais de Justiça dos Estados mais populosos e desenvolvidos, como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, têm um volume muito maior de ações para julgar. E como muitas primam pela complexidade técnica em matéria de direito penal, elas acabam sendo conduzidas por escritórios de advocacia que não hesitam em interpor os mais variados tipos de recursos judiciais – inclusive com propósitos protelatórios – na defesa de seus clientes. Por isso, como estão sobrecarregadas, essas cortes enfrentam mais dificuldades do que os demais tribunais para alcançar as metas de produtividade do CNJ. E a tramitação dos processos também tende a ser mais lenta.

A segunda maior carga de trabalho ficou com a Justiça Federal. Dos 68 mil processos distribuídos até dezembro de 2012 na instituição, cerca de 41 mil tratavam de crimes contra a administração pública. No decorrer de 2014, as varas federais e os Tribunais Regionais Federais conseguiram alcançar 58% da meta. “Pela relevância em reprimir ilícitos contra a administração, deve o Poder Judiciário empenhar-se no julgamento destas ações”, disse Gilberto Valente Martins, que representa o Ministério Público e a Procuradoria-Geral da República no CNJ e é o coordenador dessa meta, em entrevista ao Consultor Jurídico.

Os braços especializados do Judiciário que mais se destacaram no cumprimento da meta de julgar todos os processos de corrupção e improbidade administrativa distribuídos até 2012, segundo o Departamento de Gestão Estratégica do CNJ, foram tribunais pequenos e especializados. De 564 processos, a Justiça Militar Estadual julgou 546 – ou seja, cumpriu 96% da meta. Já o Superior Tribunal Militar alcançou 86% do objetivo traçado pelo órgão encarregado de promover o controle administrativo da Justiça brasileira. Outra corte com bom desempenho foi o Superior Tribunal de Justiça, que havia se comprometido a julgar 100% das ações distribuídas até 2011 e 50% das ações distribuídas em 2012. Das 9,8 mil ações relacionadas a atos de corrupção e crimes contra a administração pública, a Corte – a mais importante do País, depois do Supremo Tribunal Federal – julgou 7,5 mil, alcançando, assim, 77% da meta.

A meta relativa às ações que envolvem improbidade administrativa e crimes contra a administração pública foi criada há dois anos e meio, durante o VI Encontro Nacional do Poder Judiciário. Desde então, é um termômetro importante para avaliar o combate à corrupção. Um baixo índice de consecução da meta sinaliza pouco rigor no combate à corrupção – e, por tabela, impunidade, dado o número de processos que acabam prescrevendo. Ao revelar que em 2014 os tribunais na média cumpriram só metade da meta, o CNJ deixa claro que eles têm de se empenhar ainda mais para fazer o que a sociedade deles espera, em matéria de moralização da administração pública.

Fonte: O Estado de S.Paulo